A Lei. 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, é considerada pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) uma das três mais avançadas do mundo, entre 90 países que têm legislação sobre o tema. Sua criação é consequência da luta da própria cearense e do apoio dado por um conjunto de organizações não governamentais (ONGs) feministas que elaboraram o anteprojeto da Lei.
A lei prevê um capítulo específico para o atendimento pela autoridade policial para os casos de violência doméstica contra a mulher e permite prender o agressor em flagrante sempre que houver qualquer das formas de violência doméstica contra a mulher. Além de registrar o boletim de ocorrência e instaurar o inquérito policial (composto pelos depoimentos da vítima, do agressor, das testemunhas e de provas documentais e periciais) e remetê-lo ao Ministério Público, a polícia pode requerer ao juiz, em 48 horas, que sejam concedidas diversas medidas protetivas de urgência para a mulher em situação de violência e solicitar ao juiz a decretação da prisão preventiva do agressor.
Apesar do seu reconhecimento e dos seus avanços, a Lei Maria da Penha, que completará 19 anos em agosto, é repleta de desafios tanto para sua eficácia quanto para sua consolidação. Desde a sua criação, a lei apresenta a realidade dos persistentes altos índices de violência contra as mulheres, trazendo certo ceticismo na sociedade, é o que mostra a Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher Negra, realizada por telefone no período de 21 de agosto a 25 de setembro de 2023 pelo DataSenado e Nexus. A pesquisa revela que para 49% das mulheres negras entrevistadas, a Lei Maria da Penha as protege parcialmente, 30% dizem acreditar na sua proteção e para 20% a lei não tem efeito na prática.
De forma negativa, Quixeramobim vem se destacando com a quantidade crescente no número de casos de ocorrências envolvendo violência doméstica contra a mulher desde o início do ano. O município é um dos que mais apresenta violência dessa natureza na região do Sertão Central, conforme mostram os resumos de ocorrência fornecidos pela Polícia Militar do Ceará.
Apenas nesse início de ano, a Unidade Pronto Atendimento (UPA) de Quixeramobim notificou 5 vítimas como agressão familiar. Entre 2011 e 2022, o Sistema de Informação e Agravos de Notificação, do Ministério da Saúde, notificou 4,5 mil casos de violência doméstica contra a mulher no Estado do Ceará. Um destaque importante para os profissionais da saúde em estarem preparados para receber e encaminhar casos de violência para autoridades competentes.
Em contato com a Delegacia de Polícia Civil de Quixeramobim para levantar mais informações atualizadas, em específico, desse tipo de violência, a instituição informou que, “conforme previsão na Lei 16.562 de 22 de maio de 2018, compete à Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp) produzir, analisar e disponibilizar estatísticas e informações relacionadas à Segurança Pública do Estado, de modo que não é possível atender a sua demanda neste momento”.
Os dados da Supesp mostram que em 2024 foram registrados 896 casos de violência dessa natureza na região do Sertão Central, sendo 211 só em Quixeramobim, que perde apenas para Quixadá, registrando o maior número dos casos, 350. Especialistas informam que esse número pode ter sido influenciado pelo encorajamento das vítimas no pedido de auxílio ou ajuda, pelo fato de que Quixadá sedia mais equipamentos públicos de proteção à mulher, como Delegacia da Mulher, Casa da Mulher Cearense e uma delegacia 24h. No entanto, profissionais que fazem parte de equipes de referência do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) alertam que esses números que retratam a violência contra a mulher em Quixeramobim podem ser ainda maiores.
Para a advogada Soléria Góes Camelo, que atua na área da família, a violência doméstica não se limita a agressões físicas; ela pode se manifestar de várias outras formas, incluindo o abuso emocional, psicológico e até mesmo econômico. Em Quixeramobim virou cada vez mais frequente esse tipo de abuso. É necessário coragem por parte das vítimas para denunciar e empenho do poder público em acolher essas mulheres disponibilizando inúmeros serviços de proteção sempre que necessário.
Números de violência contra a mulher no Sertão Central em 2024
Banabuiú: 25 casos;
Choró: 14 casos;
Deputado Irapuan Pinheiro: 2 casos;
Ibaretama: 20 casos;
Ibicuitinga: 6 casos;
Milhã: 13 casos;
Mombaça: 98 casos;
Pedra Branca: 97 casos;
Piquet Carneiro: 12 casos;
Quixadá: 350 casos;
Quixeramobim: 211 casos;
Senador Pompeu: 35 casos;
Solonópole: 13 casos.
Fonte: Supesp/SSPDS
Foi tentado contato com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Ceará sobre dados atualizados de 2025, mas até o fechamento desta matéria não houve resposta. O mesmo procedimento foi realizado com a Secretaria das Mulheres, por meio da Casa da Mulher Cearense.
Como denunciar?
As denúncias podem ser feitas diariamente pelo Disque 100, delegacias de polícia civil e pela Procuradoria da Mulher do município.
Por Jândreson Gomes – Colunista do Portal Repórter Ceará